quarta-feira, 29 de junho de 2016

Os sucessivos golpes contra o funcionalismo público e por via de regra contra a sociedade gaúcha.

Os sucessivos golpes contra o funcionalismo público e por via de regra contra a sociedade gaúcha.

     
 
        Daniel da Luz Machado - Bacharel em Administração pela São Judas,         bacharelando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio           Grande do Sul.

      A lei de diretrizes orçamentárias  para o ano de 2017 foi votada no dia 28 de junho pela Assembleia Legislativa  do RS  mantendo a limitação de despesas em todas as áreas do Estado.                                                                                    Para muitas pessoas essa notícia pode até passar despercebida e talvez elas sigam sorrindo alheias em seus serviços, ou em suas casas, tudo isso, porque erroneamente estamos mergulhados em uma cultura umbilical, onde não costumamos raciocinar a respeito da interseccionalidade dos atos em uma sociedade.   

          O Governo Federal, e mais precisamente, o Governo Regional estão implementando uma dura política neoliberal e vão, além disso, não apenas se restringirem a uma questão conceitual de política, mas suas atitudes claramente tem um propósito de desacreditar ainda mais o funcionalismo público ou parte dele já que os oriundos do poder judiciário se locupletam com altos  salários e todas as reposições por perdas inflacionárias, mas explicando isso basta ver que o acesso a estes segmentos do setor público na maioria das vezes são preenchidos por pessoas oriundas das classes médias altas e também pelo efeito cascata que o mar de regalias dos magistrados acaba proporcionando.  

        Servidores públicos do executivo (Os comuns), como educadores, profissionais da segurança pública e outros terão mais uma vez que pagar a conta tendo seus vencimentos congelados por mais um ano e o que é pior sem reposição inflacionária, a custo de permitir que o estado volte a crescer e possa investir.   
         Essa postura me remete ao nefasto período militar onde o Ex-Ministro Delfim Neto pregava que o bolo deveria crescer para depois ser repartido. Há quase 30 anos os militares se foram (GRAÇAS A DEUS!!!) e eu ainda não vi a minha parte do bolo e creio que a maioria da população brasileira também.     
                                               
       O que a população precisa refletir é que o desmonte do funcionalismo público promovido pelos Governos Federal e Regional não prejudica apenas aos servidores e seus familiares, e sim prejudica a sociedade como um todo, pois é o próprio cidadão que ficará sem receber um trabalho de qualidade independente dos inúmeros impostos que venha a pagar.                   
        Também como fonte de análise do sucateamento do funcionalismo público a incidência sobre o mercado interno não pode ser desconsiderada, utilizando um exemplo pessoal e bem básico, embora não costume utilizar exemplos pessoais, pois como pesquisador uma certa dose de abstração para uma melhor leitura do contexto analisado é salutar, mas vejamos: Pretendia comprar uma motocicleta para percursos menores e me sentir mais a vontade nos escaldantes dias de verão no RS, caso adquirisse a moto teria que pagar aos cofres públicos dois IPVAs, seria um segundo meio de transporte onde consumiria mais combustível e por via de regra pagaria mais ICMS, teria assim dois veículos para manutenção. Com o total descrédito que tenho em uma Assembleia Legislativa que na sua maioria só pensa em si própria e com um Governador que parcela salários e sequer se dispõe a conversar sobre reajustes, preferi ficar apenas com o veículo que possuo. Esse exemplo micro e pessoal dá uma ideia de quanto consumo pode ser freado, deixando de fazer a moeda circular e o estado arrecadar fomentando a economia interna.          
            O que os poderosos defendem em termos de reaquecimento econômico diz respeito somente aos seus negócios e não a população em geral. Querem pseudamente  cortar despesas cortando a carne do funcionário público e jogando-o contra o resto da população que cada vez recebe menos saúde, segurança, transporte, educação e qualquer outro serviço público de qualidade.     

                  Esse mecanismo maquiavélico de desacreditar o funcionalismo reforça o senso comum que volta e meia nos brinda com atrocidades, como por exemplo, votar para Governador em um sujeito que na sua vida parlamentar nunca esteve ao lado dos interesses da maioria do povo ou simplesmente eleger em larga escala uma Assembleia Legislativa comprometida com os grandes empresários e grandes Ruralistas, cujo os olhos apenas brilham para o agronegócio, do qual eles mesmos são grandes sócios ou proprietários exclusivos.    
      
         Em um periódico da capital, vi uma foto de alguns nobres parlamentares comemorando aos sorrisos a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2017 o que tristemente me deixou pensando: Em outros tempos eles simulariam um certo pesar por tomarem uma medida tão amarga, hoje eles riem abertamente e não se constrangem nem um pouco de parasitarem e repassarem a conta para o resto da sociedade.

O descaso que custa caro a toda uma sociedade







Daniel Machado da Luz - Bacharel em Administração pela São Judas, bacharelando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.









O descaso que custa caro a toda uma sociedade

             Imagine que o seu carro teve uma pane assim sem mais nem menos e você chama o guincho, leva-o até a oficina e tem das mãos do mecânico responsável o orçamento e a descrição dos problemas que afetaram o veículo e você simplesmente o desqualifica dizendo que achas que o problema é outro. Detalhe você mal sabe trocar um pneu, ou você pode imaginar-se também indo ao médico, fazer um exame e quando ele for lhe explicar a enfermidade que te acomete, você simplesmente desqualificar o seu médico e dizer que achas que o diagnóstico é outro.    

          Nesses dois exercícios de ficção ninguém desacredita o profissional em questão, caso tenha dúvida da competência, o que se faz é consultar uma segunda opinião que lhe transmita mais credulidade.   Por que não utilizar em relação aos conceitos das ciências humanas a mesma lógica de ação?     

            Ninguém é dono exclusivo da verdade e, além disso, todos os saberes podem ser salutares e consideráveis. Opinar é importante e também se constitui em uma das premissas básicas de um ambiente democrático e falando em democracia não podemos desconsiderar a juventude de nossa experiência democrática, pois  ainda não faz 30 anos que após o nefasto golpe militar voltamos a eleger diretamente um Presidente da República.    
           O Golpe político impetrado pelo “Presidente Interino” respaldado por políticos de “Vida e Ficha” amplamente sujas, Os descontroles dos gestores públicos como, por exemplo, o Governo do Estado do RS e outros que sequer cumprem a prerrogativa legal de pagarem o funcionalismo em dia, Os retrocessos que ameaçam políticas públicas consolidadas,  As ameaças em torno da CLT e da Previdência Social, a truculência militarizada da polícia em relação a estudantes e professores no caso de ocupações  enfim para todos esses aspectos que norteiam a sociedade, não está vedado a nenhum cidadão o direito de opinar a respeito, mas quando essa opinião não se baliza em estudos ou ao menos o bom senso de ouvir e ler profissionais que se debruçam nessas pautas, é claro que na leitura você pode desfrutar de várias tendências, muitas até maldosas como costumam alguns políticos desonestos ou jornalistas de grandes veículos midiáticos que ao seguirem os interesses dos seus patrões procuram moldar a opinião do seu público leitor, ou ouvinte para reproduzir o mantra do senso comum.         

             Mas se o cidadão, apesar da correria cotidiana, começar a desenvolver o hábito de ouvir mais de uma opinião e refletir sobre ela e passar a considerar que Historiadores, Antropólogos, Sociólogos, Cientistas Políticos  tem a dizer e mais se acrescerem a leitura antes de posicionarem-se enfaticamente  a respeito de qualquer pauta, certamente a democracia sairá ganhando.     
  
      Em hipótese alguma reverencio o saber acadêmico como guia absoluto do conhecimento, muito pelo contrário, fora da academia consolidamos muitas questões que em função de certa elitização passam despercebidamente, mas desacreditar as ciências humanas como  costumeiramente  se faz  no Brasil em nada contribuirá para avanços que a sociedade precisa. 
            Por aqui respeitamos a opinião do médico, do engenheiro, do eletricista, do estilista, do astrólogo enfim da maioria das pessoas, mas quando se trata de uma análise de pessoas que se debruçam por horas a fio na interpretação desses fenômenos, simplesmente elege-se o mantra do senso comum como guia absoluto e inquestionável e sendo assim voamos rasantemente na consolidação de ideias que não foram aprofundadas e o que é pior desconsideramos as opiniões construtivas que esses profissionais poderiam nos passar.       
                                                                                    
          Temas de grande vulto e relevância não merecem a binarização e o reducionismo de uma conversa de bar, onde as metáforas imbricam-se com a descontração e o tema abordado não urge a nossa porta, temas relevantes merecem análises mais aprofundadas e contributivas  para um aprimoramento no status quo.     

         Portanto, antes de simplesmente  dar seu veredicto final sobre determinada pauta social, procure não deslegitimar quem se debruça nessas análises. O conhecimento não deve ficar em uma redoma onde poucos se locupletam, mas a humildade de buscarmos informações com os que se dedicam a determinada causa sempre é salutar, caso contrário correremos o risco de opinar sobre robótica ou física quântica baseada na manchete do Jornal Nacional ou em alguma postagem do Facebook.

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Vivemos uma primavera estudantil brasileira?

                       Vivemos uma primavera estudantil brasileira?

Meri Machado - Licenciada em História pela Universidade Luterana do Brasil, bacharelanda em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Apesar do conservadorismo crescente - inclusive entre os jovens - apesar do momento político de lamentável fragilização da democracia brasileira em vista do processo de destituição da presidente com questionável base jurídica; há um foco de resistência advindo tanto das escolas públicas quanto privadas a esse pensamento reacionário aparentemente irrefreável.

Acredito que estamos presenciando uma “primavera dos estudantes secundaristas” no Brasil. Saliento os secundaristas porque são predominantes nas ocupações que vêm ocorrendo desde o final de 2015 quando a Escola Estadual Diadema, no Estado de São Paulo, foi ocupada pelos estudantes em protesto ao projeto de reorganização escolar proposto pelo governo de Geraldo Alckmin cujo objetivo real, segundo alunos, professores e gestores escolares; era cortar verbas para a educação com o fechamento de escolas ao remanejar mais de um milhão de alunos, demitir professores temporários e trabalhadores terceirizados e lotar ainda mais as salas de aula. Além disso, a proposta não foi debatida de maneira democrática, envolvendo todas as comunidades escolares, e sim, imposta de forma autoritária.

Desde o final de março e no decorrer do mês de abril deste ano presenciamos a ocupação de dezenas de escolas do Estado do Rio de Janeiro por estudantes em protesto às precárias condições físicas dos prédios e espaços pedagógicos, superlotação das salas de aula, falta de infra-estrutura e demissão de funcionários responsáveis pela segurança. Os alunos que ocuparam as escolas no Rio de Janeiro atuaram também em apoio aos seus professores que estavam em greve desde o início de março por conta do atraso dos salários dos servidores públicos.

As escolas estaduais e escolas técnicas de São Paulo voltaram a ser ocupadas pelos estudantes em maio deste ano: o motivo era, além das questões já há muito pauta das reivindicações (como aumento dos salários dos professores, protesto pelos cortes na educação, precarização e sucateamento), o desvio da verba destinada para a compra da merenda escolar (um escândalo de corrupção no governo Alckmin curiosamente pouco explorado pela mídia).

Em fevereiro tivemos o mesmo processo de ocupação nas escolas secundaristas do Estado de Goiás. Os estudantes goianos protestavam contra a adoção de OSs (Organizações Sociais) para administração das escolas pois essa medida representava uma sinalização para um processo silencioso de privatização do ensino público.

Ainda em fevereiro tivemos um interessante protesto numa escola privada de Porto Alegre (que foi muito mal interpretado pelas mídias e influenciou negativamente a opinião pública): um movimento protagonizado pelas alunas que ficou conhecido como “a revolta do shortinho”. Multiplicaram-se as críticas tentando desmerecer o protesto utilizando o argumento de que uma escola privada como o Colégio Anchieta poderia normalizar a vestimenta das meninas e já que elas não estavam satisfeitas que buscassem outra instituição de ensino. Mas a discussão naquele caso era muito mais profunda. As meninas protestavam por serem contrárias ao argumento utilizado pela sociedade patriarcal de que as mulheres são culpáveis pelo assédio que recebem ou qualquer tipo de desrespeito ou violência quando estão vestidas de uma forma e não de outra. Cobravam também o diálogo no estabelecimento das regras. Elas queriam ser ouvidas.

Ainda no Rio Grande do Sul, cuja administração estadual utiliza o argumento da crise financeira para sufocar o funcionalismo público com a perda de direitos e parcelamento dos salários, os professores deflagraram a greve e os estudantes (de Ensino Fundamental e Médio) em apoio - e tendo também suas próprias reivindicações – em fins de maio já ocupavam mais de centena de estabelecimentos. Os movimentos, assim como os que ocorreram e ocorrem em São Paulo, por exemplo, são bastante organizados e alavancados pelos grêmios estudantis. Os alunos mobilizados, de modo geral, organizam cronogramas de atividades culturais e educativas, dividem tarefas, organizam e limpam o espaço escolar e contam com o apoio de movimentos sociais e grupos ligados a universidades.

No dia 13 de junho, um grupo de estudantes ocupou o saguão da Assembleia Legislativa em protesto contra o PL 44/2016 (que é interpretado como uma tentativa de privatização do ensino público) e exigindo o posicionamento do governador a respeito do PL 190/2015 conhecido como “Escola sem Partido”. No dia seguinte, foi divulgada a notícia do fechamento de acordo entre algumas representações estudantis e o governo do Estado: os estudantes se comprometeram a desocupar a AL e as escolas com a proposta de votação do PL 44/2016 ficar para 2017 após intenso diálogo com todas as partes envolvidas (base aliada, oposição, governo, estudantes, professores). No entanto, um grupo de estudantes não aceitou o acordo e ocupou a Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul (SEFAZ) no dia 15.

A polícia militar, numa ação com uso de força desmedida, deteve dezenas de estudantes e efetivamente os arrastou para fora do prédio utilizando-se ao mesmo tempo de spray de pimenta e escudos para conter os manifestantes. Os estudantes, a maioria de adolescentes, foram levados à força para dentro de alguns micro-ônibus sob protestos e grande confusão.

Nesse cenário, há que se analisar o crescente processo de politização dos estudantes. É cedo ainda para que possamos argumentar com propriedade sobre causas e efeitos desses movimentos, porém, já podemos observar que há mudanças ou que se necessitam mudanças na forma como a escola e o poder público lidam com as demandas estudantis. É imperativa a necessidade do diálogo.

A escola que, na teoria, seria o palco para o embate das ideias atua como podadora de iniciativas e muitas vezes se esquiva de tratar temas polêmicos porém caros para que se possa formar cidadãos críticos e atuantes na sociedade. O poder público, por sua vez, abandona os professores, abandona a educação, abandona os jovens com a falta de políticas adequadas destinadas aos mesmos e na falta de investimento.

Por fim, considero que há uma consciência se formando entre os estudantes: consciência da própria força e consciência dos seus direitos e deveres. Há uma necessidade de serem ouvidos e algo que vejo com bastante otimismo: um senso de coletividade e colaboração. Que os movimentos estudantis sirvam de exemplo e que sejam uma constante daqui por diante. Há um fio de esperança.