Religião,
Racismo e o Espaço Escolar: os desafios do professor no cumprimento da Lei
11.645.
Nesta
semana ouvi o relato de um colega, professor de história da rede pública
estadual, sobre as dificuldades que está encontrando no que se refere ao
cumprimento da Lei 11.645, que inclui no currículo o ensino da história dos
povos africanos (lei 10.639) e dos povos indígenas (ampliada pela lei 11.645.
Pois
bem, este professor nos relatou que, em uma turma de determinada escola, ele
estava abordando os Grandes Reinos Africanos, como sabemos, bem antes da
chegada dos europeus no continente africano, existiam grandes reinos, e o
conteúdo do eixo temático era esse.
Ora,
quando abordamos civilizações, tanto antigas quanto modernas, no desenvolver da
explanação do conteúdo são trabalhadas questões como localização, agricultura,
organização social, organização política, e, é claro, a religião, obviamente
sem um enfoque proselitista, mas sim informativo, uma vez que esta é uma
característica muito forte e que se verifica em praticamente todas as
civilizações.
Quando
o professor abordou sobre a religião deste reino, uma aluna, que se declarou
ser evangélica, protestou contra o conteúdo, inclusive se negando a ao menos
copiar o que foi passado no quadro, alegando que não era obrigada a ter contato
que “coisas do demônio”. Um tanto aturdido com
a reação desta aluna, o professor explicou que não se tratava de uma
abordagem religiosa do tema, mas sim da explanação de como era a religião
daquele povo, e mesmo assim a aluna se manteve na sua postura, inclusive na
aula seguinte, que era a seqüência do tema.
Essa
relato me deixou profundamente incomodado, muito por ter uma leitura da escola
como um local de produção de conhecimento, de ciência, mas sobretudo, em uma
visão freiriana, como um vetor de libertação, onde temos a oportunidade de nos
libertar, não só das cadeias de reprodução social, mas também de questões como
racismo, preconceito e intolerância, em especial nesse caso a intolerância
religiosa.
Compreender
a escola como um local de diversidade cultural, uma vez que os alunos trazem
consigo suas bagagens culturais, é fundamental neste processo de aprendizagem e
da própria criação das identidades , uma vez que é na alteridade é que
construímos, definimos o que somos ou não, mas sobretudo desenvolvendo o
respeito ao diferente, ao outro.
Quando
vejo reações como dessa aluna, me faz refletir acerca de como a diversidade é
abordada nos currículos escolares, uma vez que, não descartando obviamente a
participação da família na formação do aluno enquanto ser social inserido nesse
espaço de socialização que é o familiar, a escola deve pensar de modo muito
consciente na elaboração de seus currículos, que devem abordar de modo positivo
a diversidade, abandonando os modelos tradicionais de educação, que em grande
parte das vezes desempenha um papel reificador de questões como o racismo e o
preconceito, ao invés de desconstruí-los.
Questões
de foro íntimo, como religião, que é o viés principal dessa discussão, devem
ser respeitadas no âmbito escolar, contudo, não deve interferir na vida escolar
do aluno, salvo questões de ordem prática, como sabatistas por exemplo, mas
quando se pensa em questões curriculares, não é admissível que, por ter
determinada crença, o aluno deixe de cumprir o que se espera desta função
social, colocando sua religião, que é de foro íntimo, como norteador do que se
aprenderá na escola ou não, que é um espaço social de foro público, logo, esses
dois foros não devem ser confundidos, assim como a função social de aluno ou de
membro de determinada religião.
A
escola, portanto, é lugar de ciência, de aprendizagem, onde os atores sociais
envolvidos apresentam uma grande diversidade cultural, e essa diversidade deve
servir para enriquecer as relações sociais na escola, sem contudo interferir no
processo de formação do currículo, especialmente tendo a religião, que é um
fator pessoal, como crivo.
A
importância da aplicação da Lei 11.645 é fundamental, e para que efetivamente
seja parte integrante do currículo, não meramente por obrigatoriedade, mas sim
por um entendimento dessa importância por parte de toda a comunidade escolar,
que é múltipla e diversa, e que essa diversidade seja fator de enriquecimento
da educação, jamais como vetor de tolhimento, de limitação do saber e da
produção do conhecimento.
Perfeito o enfoque.
ResponderExcluirMuito boa abordagem, parabéns!
ResponderExcluirMuito boa visão das necessidades, para a efetiva aplicação do aprendizado de conceitução e de comparação das diversidsdes culturais. Porém, fico pensando que esse radicalismo ou exclusivismo de opinião, aqui exemplificado,tavez esteja longe docontrole ou influência da comunidade escolar, devido a influência desigual e opressora que tradiçoes familiares, exercem sobre as pessoas no seio familar, sobretudo sobre crianças e adolescentes doutrinandos comuns ou filhos de lideranças religiosas.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirNão estranho a atitude de alunos em relação a determinados conteúdos que abordam temas de natureza histórica, imagina se fôssemos estudar o oriente médio, a Turquia, Arábia, Iran etc é fôssemos nos aprofundar nos aspectos religiosos como é o tema proposto acima, não teríamos somente um aluno com posições divergentes e espalhafatosas, teríamos o caos dentro da sala, a intolerância religiosa nos dias atuais é fruto da ignorância inrraizada nas profundezas da alma dos seres mais embrutecidos e rebeldes que pululam as orbes terrestres tanto de encarnados como de desencarnados, assim diante de possíveis controvérsias professores de história em níveis mais elevados teriam que ter visão aguçada ao preparar os conteúdos evitando aprofundar em temas que possam gerar controvérsias de tal natureza, isso é óbvio somente nas questões religiosas, nas demais o aspecto precisa e deve ser debatido, devemos lembrar sempre que o fundamento religioso é religar, teoricamente a Deus, mas sabemos que o Deus meu não é necessariamente o seu, nem muito menos o dos demais seres que nos rodeiam, por que afinal, O (que)é Deus mesmo????
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