Corpos abjetos no âmbito escolar: a
hegemonia do discurso heteronormativo na abordagem de Gênero na escola.
Sérgio Pires - Licenciado em Ciências Sociais pela UFRGS; Bacharelando em Ciências Sociais com ênfase em Antropologia pela UFRGS.
“
Olha só meu corpo aqui, eu existo sim... ”, este é um trecho da conversa que
tivemos com Maria Clara, durante o almoço no dia de sua chegada a Porto Alegre,
para a sua palestra na Aula Aberta “Por uma Antropologia Trans: descolonização
das identidades abjetas”, na qual tivemos a oportunidade de trabalhar em sua
organização.
Durante a aula, ouvimos professores
do departamento de Antropologia falando sobre o tema, e especialmente a fala da
Maria Clara, que nos trouxe um panorama dos principais desafios e dificuldades
vividos por homens e mulheres transgênero. Importante destacar a participação
do público presente, formado por acadêmicos, não só da UFRGS, mas também por
interessados pele temática. Destaco principalmente a participação de uma mulher
trans que disse que a fala da Maria Clara lhe trouxe mais esperança para seus
dias, o que evidenciou o quanto essa parte da população sofre com o preconceito
e a intolerância.
Impossível, enquanto educador, não
fazer uma reflexão, a partir desses relatos, se a escola como um todo e de modo
específico a minha escola está pronta para quebrar paradigmas tradicionais,
deixando de reproduzir o binarismo nas abordagens de gênero e ampliar o debate
abordando sobre homossexualismo, bissexualismo, transsexualismo e transgênero.
Partindo dessa inquietação, e do
fato de termos entre nossos alunos um aluno transgênero, busquei informações
referentes, tanto sobre as propostas nos Parâmetros Curriculares Nacionais,
quanto sobre o que os colegas pensam a respeito dessa temática e como a
trabalham com suas turmas, assim como, para a produção desse artigo, busquei
autores que possuem trabalhos relativos a questão de Gênero e Sexualidade.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais e a
abordagem de gênero e sexualidade.
O principal objetivo dos Parâmetros
Curriculares Nacionais é servir como um meio de auxílio na execução do trabalho
docente, um instrumento de apoio para as discussões pedagógicas na escola, na
elaboração de projetos educativos, no planejamento das aulas, na reflexão sobre
a prática educativa, através da sugestão de temas norteadores e transversais,
cabendo ao professor também fazer uso de outros materiais didáticos, além dos
livros disponibilizados pelo MEC, na elaboração de suas aulas.
O
capítulo que aborda Gênero e Sexualidade, tem como título “Orientação Sexual”,
e tem como objetivo promover reflexões e discussões de técnicos, professores,
equipes pedagógicas, bem como pais e responsáveis, com a finalidade de
sistematizar a ação pedagógica no desenvolvimento dos alunos, levando em conta
os princípios morais de cada um dos envolvidos e respeitando, também, os
Direitos Humanos, considerando a sexualidade como algo inerente à vida e à
saúde, que se expressa desde cedo no ser humano, e engloba o papel social do
homem e da mulher, o respeito por si e pelo outro, as discriminações e os
estereótipos atribuídos e vivenciados em seus relacionamentos, a contaminação
por AIDS e da gravidez indesejada na adolescência, entre outros, que são
problemas atuais e preocupantes.
O
capítulo também cita o papel da família nesse processo, que é o primeiro espaço
onde a temática é abordada, com a finalidade de transmitir os valores que cada
família adota como seus e espera que as crianças os tomem para si. Dessa
maneira, a escola deve abordar os mais diversos pontos de vista sobre o tema,
bem como valores e crenças existentes da sociedade, através da problematização,
do levantamento de questionamentos e de oferecer um amplo leque de
conhecimentos e opções para ajudar o aluno a encontrar um ponto de auto
referência por meio da reflexão, logo, o trabalho exercido pela escola, não tem
como objetivo competir com o que se aprende com a família, mas sim, tem um
papel complementar.
Outra questão abordada é a postura do
educador referente a abordagem de gênero, que deve reconhecer como legítimo e
lícito, por parte das crianças e jovens, a busca do prazer e as curiosidades
manifestas acerca da sexualidade, uma vez que fazem parte de seu processo de
desenvolvimento, e ao atuar como o profissional que compete conduzir o processo
de reflexão que possibilitará ao aluno autonomia para eleger seus valores,
tomar posições e ampliar seu universo de
conhecimentos, o professor deve ter discernimento para não transmitir seus
valores, crenças e opiniões como sendo verdade absolutas, não se pode exigir do
professor isenção absoluta no tratamento das questões relativas a sexualidade,
mas a consciência sobre quais são os valores, crenças, opiniões e sentimentos
que cultiva em relação à sexualidade é um elemento importante para que
desenvolva uma postura ética na sua atuação junto dos alunos. O trabalho
coletivo entre professores, supervisão e orientação escolar, ajudará nesse
processo.
Neste capítulo há também os
objetivos gerais de orientação sexual para a educação básica:
·
Respeitar a diversidade de valores, crenças e
comportamentos existentes e relativos à sexualidade, desde que seja garantida a
dignidade do ser humano;
·
Compreender a busca do prazer como uma
dimensão saudável da sexualidade humana;
·
Conhecer como determinações culturais as
características socialmente atribuídas ao masculino e ao feminino,
posicionando-se contra discriminações a eles associadas;
·
Identificar e expressar seus sentimentos e
desejos, respeitando os sentimentos e desejos do outro;
·
Proteger-se de relacionamentos sexuais
coercitivos e exploradores;
·
Reconhecer o consentimento mútuo como
necessário para usufruir de prazer numa relação a dois;
·
Conhecer e adotar práticas de sexo seguro, ao
iniciar relacionamento sexual;
·
Desenvolver consciência crítica e tomar
decisões responsáveis a respeito de sua sexualidade;
·
Procurar orientação para a adoção de métodos
contraceptivos.
·
A diversidade de comportamento de homens de
mulheres em função da época e do local onde vivem;
·
A relatividade das concepções
tradicionalmente associadas ao masculino e ao feminino;
·
O respeito pelo outro sexo, na figura das
pessoas com as quais se convive;
·
O respeito às muitas e variadas expressões do
feminino e do masculino;
Conversando com educadores sobre a
abordagem de gênero e sexualidade na escola.
Tendo em vista construir um panorama
de como os educadores da escola percebem, interpretam e trabalham questões
referentes a abordagem de gênero e sexualidade na escola, e, apesar de este
artigo não estar propriamente abordando o estudo de caso de nosso aluno
transgênero, mas abordando a postura do educador junto a esse aluno, propus uma
conversa com alguns professores, onde eles puderam responder as minhas
indagações, assim como também entrevistei a supervisora pedagógica. A seguir as
questões e respostas dos colegas (os nomes foram abreviados):
a) A
abordagem sobre as questões de gênero e sexualidade faz parte dos PCN’s. Como
você aborda essa temática em sala de aula? Quais recursos você utiliza para
fins de complementação de sua abordagem?
Professora E: Na
verdade, o tema ainda é pouco abordado em sala de aula, principalmente com
alunos menores, que são minha área de atuação (Fundamental II – 6º ao 9º ano).
Mas conversamos sobre o assunto e trabalho com textos em Português, Ciências e
Ensino Religioso. No ano de 2012 tive um aluno que vivia com a mãe e sua
companheira, então, quando fomos trabalhar a questão familiar surgiu o momento
em que tratamos do assunto e o colega expôs sua vivência sem constrangimento.
Trabalhamos os valores, o diferente e o conhecimento do próprio corpo, onde
abordamos a questão dos gêneros (muito sutilmente).
Professora M: As
questões que envolvem gênero e orientação sexual, geralmente, causam polêmicas
e desconfortos quando tratados com alunos. Da mesma forma em qualquer grupo
social. Abordando pelo aspecto cultural, assuntos polêmicos não são debatidos e
a não realização desse ato se dá ao respeito quanto a opinião, normalmente está
encontra-se embasada em valores familiares e bagagem de vida. Por isso, não há
um planejamento dentro do currículo escolar que permite a abertura para
assuntos condizentes a este tema. Assim, sempre que, levantada esta questão, a
mesma é tratada de modo informal abrindo espaços para diversas opiniões sem
chegar a um ponto comum, visto que não há formação contínua para professores.
Se há profissionais capacitados são em número raro e desconhecido.
Professora L:
Costumo abordar nas aulas de Ed. Física com os 8º e 9º anos e no ensino médio
nas aulas de Ensino Religioso. Através de debates, perguntas e curiosidades
partindo dos próprios alunos. Utilizo um material que possuo de um curso de
formação de professores chamado “Ficando a par”.
Professor O: Não
há um planejamento e nem um tempo reservado para o estudo e abordagem dessa
questão. Quando isso ocorre é de forma improvisada, se dá a partir de uma
ideia, situação cotidiana, cena de filme, etc.
b) A
abordagem dos PCN’s relativas a sexualidade demonstra um binarismo em seu
discurso, ou seja, referem-se a pai/mãe, homem/mulher, bem como suas funções
sociais pré-definidas, tendo como fator de diferenciação apenas questões
referentes a cultura. No espaço escolar, você acha que devemos abordar questões
relativas a homossexualismo, bissexualismo, transexuais e transgênero?
Justifique.
Professora E: Acho
que sim, mesmo porque, as famílias de hoje convivem com as questões do
homossexualismo, bissexualismo, etc. A formação das famílias estão mudando
daquele perfil tradicional.
Professora M: Na
abordagem relativa a sexualidade é usada os termos homem/mulher caracterizando
um modelo familiar tradicional antigo e ultrapassado. Nas novas concepções
familiares caracterizam um grupo de pessoas que compartilham a mesma moradia
onde prevalecem o amor, o carinho, o respeito e a cumplicidade. No que diz
respeito ao “grupo de pessoas” não está definido sexo e nem orientação sexual.
As questões que envolvem gênero, orientação sexual, novas concepções de família
devem ser debatidos em sala de aula, informalmente ou formalmente, sempre tendo
o cuidado para o não uso do caráter tendencioso. Jamais usar opinião pessoal
como verdade absoluta.
Professora L: Não
só acho como é fundamental nos dias de hoje orientá-los, pois as políticas
LGBT’s estão no cotidiano de todos.
Professor O:
Sim, devemos abordar questões sobre homossexualismo já que a escola é um espaço
democrático e direito de todos os jovens ou adultos que frequentam a escola.
c) Considerando
que você tenha entre seus alunos um (a) aluno (a) transgênero, masculino ou
feminino, e que este (a) aluno (a) requisitasse ser chamado por seu nome
social, qual seria sua postura como docente? Justifique.
Professora E: Não
tive nenhum aluno transgênero (só o caso dos pais), não sei como reagiria a
esta situação, mas acho que nos trabalhos, provas e documentos do aluno
solicitaria seu nome de registro, porém, em sala de aula, no convívio social
com colegas, poderíamos manter o nome de sua preferência.
Professora M: A
postura do docente não pode ser diferente do decreto nº. 8727 de 28 de abril de
2016, que ampara toda a pessoa no que diz respeito ao uso do nome social e ao
isso de todos os serviços condizentes ao seu gênero em todo o território nacional,
sem mais.
Professora L:
Esta situação, ao meu ver, é superdelicada, pois esta é a vontade dele e
acredito que devemos respeitá-la, mas existem também questões que nós
professores devemos tomar cuidado, como a aceitação da família e dos colegas, para
não colocarmos este aluno em exposição negativa.
Professor O:
Respeito a individualidade do aluno que antes era aluna, mesmo pensando que a
troca de nome, por exemplo, seja desnecessária. Isso ocorre em nossa escola.
Supervisão Escolar, Legislação e
Garantia dos direitos
Para
além da sala de aula, existem questões de ordem prática, relativas ao
funcionamento da escola, que ainda não estão adaptados para atender o que já
está garantido por lei para alunos transgêneros. Uma dessas questões se refere
a parte burocrática, de documentação dos alunos. Segundo o Decreto 8727, de 28
de abril de 2016, que dispõe sobre o uso do nome social e reconhecimento de
identidade de gênero de pessoas travestis ou transexuais. No seu artigo 4º,
prevê que constará nos documentos oficiais o nome social da pessoa travesti ou
transexual, se requerido expressamente pelo interessado, acompanhado do nome
civil.
Na secretaria da escola, os colegas
informaram que nos documentos oficiais da escola, assim como nos programas oficiais
de banco de dados do Governo do Estado, não há espaço para nome social,
inclusive não há também nos cadernos de chamada, e todos os documentos,
certidões, atestados fornecidos pela secretaria são feitos com o nome de
registro do aluno.
Em uma ocasião, tive a oportunidade
de ouvir colegas professores comentando sobre nosso aluno transgênero e de sua
solicitação de passar a usar o banheiro dos meninos, uma vez que, por ser
menino, não se sente à vontade em usar o banheiro das meninas.
Nesse sentido procurei nossa
supervisora, professora “MC”, e lhe expus essa situação, mencionando a
Resolução Nº 12, de 16 de janeiro de 2015, que em seu Artigo 6º fala que deve
ser garantido o uso de banheiros, vestiários e demais espaços segregados por gênero,
quando houver, de acordo com a identidade de gênero de cada sujeito. Como
resposta, a supervisora perguntou-me se a escola terá que construir banheiros
especiais para esses alunos, e que este artigo por ser interpretado de muitas
maneiras diferentes. Alegou também que não tem nada contra a “opção sexual” de
quem quer que seja, contudo, devemos levar em conta a opinião da comunidade
escolar sobre esse assunto, que deveria ser debatido com as famílias antes de
qualquer decisão. E ao final de sua fala, deu sua opinião como mãe, afirmando
que não gostaria de ver seus filhos dividindo um espaço como o banheiro com
alunos “transgênicos”, que segundo sua interpretação, são pessoas que não se
identificam com nenhum dos sexos.
Mesmo que este relato seja da supervisora,
essa opinião reflete o pensamento da maioria dos professores e professoras da
escola.
Corpos abjetos na escola: construção de
identidades versus a reprodução de paradigmas.
O debate sobre a escola e suas
finalidades está sempre em voga nas Ciências Sociais, muito já foi escrito e
muito mais ainda será. Se rebuscarmos um dos pais da Sociologia, Emile
Durkheim, podemos dizer que a função primordial da escola é ensinar aos atores
sociais seu papel na sociedade; em uma leitura mais simples, podemos também
citar que a escola é o lugar onde os “velhos” ensinam como os mais jovens devem
viver. Outro grande nome da Sociologia Contemporânea, talvez um dos maiores
sociólogos de todos os tempos, Pierre Bourdieu nos disse que é na escola que a
sociedade reproduz o status quo
vigente.
Contudo, quando falamos sobre
educação e sexualidade, Guacira Lopes Louro nos diz que a sexualidade está na
escola, faz parte dos sujeitos, ela não é algo que possa ser desligado ou algo
do qual alguém possa se despir.
Segundo a autora, enquanto
educadores, devemos desconfiar do que é tomado como natural, como práticas
rotineiras, em um sistema escolar onde alunos que agem “fora do naturalmente
aceito”, são motivos de preocupação, apresentam desvios de comportamento.
Nesse sentido, faz-se necessário uma
grande reflexão sobre a própria prática docente e sobre o uso da linguagem, ou
seja, termos ou expressões que possam denotar ou insinuar racismo, sexismo,
etnocentrismo, uma vez que não podemos avaliar qual o sentido que os alunos
darão ao que ensinamos a eles. Essa preocupação da autora com a linguagem se
justifica porque a linguagem perpassa, atravessa os alunos, expressando
relações, poderes, lugares, produzindo, instituindo e fixando tipologias.
Na tentativa de desconstruir
paradigmas como o binarismo, é necessário que desenvolvamos um olhar bem mais
atento, uma vez que a problematização que não fica limitada no binarismo
torna-se muito mais ampla e oferece múltiplas combinações. Para tanto, exige-se
uma pesquisa mais apurada, lançando mão de pesquisas mais recentes, tendo em
vista que o livro didático ainda possui um modelo heteronormativo.
E
esse fato não é gratuito, uma vez que a ocultação ou negação da inclusão nas
abordagens de gênero os gays, lésbicas, travestis, transexuais e transgênero,
pode revelar uma intenção de eliminar ou evitar que esses conteúdos sejam
abordados em sala de aula tendo em vista manter a garantia da normalidade, ou
seja, da heteronormatividade.
Em
relação ao normativo, podemos citar Strathern, que em seu texto “Necessidade de
Pai, necessidade de mãe”, fala que quando algo foge do normativo, o choque, ou
melhor, o conflito causado é muito grande, e esse conflito percebemos no âmbito
escolar quando alunos ou alunas saem do normativo no que se refere a gênero, e,
citando Joan Scott, dessa maneira não se enquadram nessa construção inteiramente
social das ideias sobre os papéis próprios aos homens e mulheres. Scott nos diz
ainda que gênero é uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado.
Nesse
sentido, também podemos citar Judith Butler, que nos diz que a
heteronormatividade é uma eleição arbitrária da heterossexualidade como norma
de conduta, de desejos, de afetos, enquanto que o sujeito é um sujeito em processo,
constituído no discurso pelos atos que executa, ou seja, para Butler o gênero
não é algo que se é, mas algo que se faz, logo gênero é social, enquanto que o
sexo é natural.
Conclusão
Todo
jovem educador, no início de sua carreira, se depara com um grande desafio:
quebrar antigos paradigmas da profissão. Velhos modelos e fórmulas não
condizentes com a atualidade ainda estão no dia a dia do mundo escolar. E não
se trata obviamente de idade dos docentes, pois felizmente há professores que
já estão no final de suas carreiras e possuem uma energia vibrante, conectados
com a modernidade e os avanços da prática docente. A reflexão sobre a prática,
sem dúvida, é o grande instrumento para que o educador possa avaliar o quanto
sua atuação está ou não atravessando seus alunos, que por sua vez não tem
apenas a escola como meio de alcançar o conhecimento. Nesse sentido, cabe ao
professor, consciente de que não detém a hegemonia do conhecimento, continuar
estudando, se aprimorando para dar conta dessas novas demandas.
Nestas novas demandas, podemos
incluir os mais recentes debates e discussões sobre gênero e sexualidade, e das
inúmeras possibilidades de abordagens referentes a estes assuntos. Muito mais
do que estar bem preparado para ministrar as aulas com segurança sobre
determinados temas, o refinamento do professor também compreende o
desenvolvimento de uma compreensão acerca do que está tratando, é necessário
que apreenda para poder ensinar. No que se refere a gênero e sexualidade, é
necessário que, para poder efetivamente quebrar velhos paradigmas e não
reproduzir o status quo vigente, é fundamental que o professor possa se livrar
dessas amarras, para que uma vez liberto de preconceitos, possa efetivamente
ensinar com propriedade, ou seja, muito mais do que uma boa didática, mas com
um viés mais humano, mais próximo do aluno, que poderá compreender e apreender
muito melhor do que a mera retórica.
A escola ainda está engatinhando no
que diz respeito a temática desse artigo, muito pela falta de vontade de aprender
dos professores, que ficam focados apenas em transmitir o que os livros
didáticos indicam, sem a menos saber quem são seus alunos e a realidade da
comunidade na qual a escola está inserida, como nos ensinou Karl Manheim.
Quando se fala em identidade abjetas,
infelizmente, o discurso presente nas falas da maioria dos professores ainda é
de intervenção médica, uma vez que veem esses alunos e alunas como desviantes,
como alunos e alunas que precisam de um acompanhamento psicológico e
psiquiátrico. Essa perspectiva é compartilhada também pela orientação e
supervisão pedagógica, que muitas vezes tem pouco ou nenhum conhecimento acerca
dessa temática, haja visto nos conselhos de classe, por exemplo, o uso de
termos pejorativos para se referir a alunos e alunos LGBT’s, e uma grande
resistência com relação ao uso do nome social por alunos transgêneros.
A escola, mesmo sendo um espaço
social plural, ainda se mantém presa, no que diz respeito a formação de
currículos e conteúdos, ao binarismo, ao heteronormativo, sendo contudo um
espaço que inclui, não apenas alunos mas também pais, professores e
funcionários homossexuais, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros,
que não são contemplados nas disciplinas que abordam gênero e sexualidade, e
nem tem espaço em atividades sociais da comunidade escolar como, por exemplo, o
“Dia da Família”. Esse velamento proposital desses atores sociais nos mostra o
quanto ainda há que se lutar para que o espaço escolar possa ser de fato
plural, diverso e livre, cabendo as novas gerações de educadores se empenharem
para descontruir esse modelo de escola que tipifica como desviante todo e
qualquer comportamento que fuja do normativo.
Referências:
STRATHERN,
Marilyn. “Necessidade de Pais, Necessidade de Mães”. Revista de Estudos
Feministas, 3 (2), p. 303-329
BUTLER,
Judith. Fundamentos contingentes: o feminismo e a questão do pós-modernismo.
In: Cadernos Pagú. Campinas: Núcleo de estudos de Gênero/UNICAMP, v.11, p.
11-42, 1998.
SCOTT,
J. W. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade,
Porto Alegre, v.20, n.2, p. 71-99, 1995
LOURO,
Guacira Lopes. Gênero, Sexualidade e Educação – Uma perspectiva
pós-estruturalista. Cap. 3 – A construção escolar das diferenças, p. 57 –
88. Ed Vozes. 6ª Ed. 2003 – Petrópolis -
RJ
Decreto
Nº 8.727. De 28 de Abril de 2016 – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA – CASA CIVIL –
SUBCHEFIA PARA ASSUNTOS JURÍDICOS
Resolução
Nº 12. De 16 de Janeiro de 2015 – CONSELHO NACIONAL DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO
E PROMOÇÕES DOS DIREITOS DE LÉSBICAS, GAYS, TRAVESTIS E TRANSEXUAIS – CNCD/LGBT
Parâmetros
Curriculares Nacionais – Pluralidade Cultural – Orientação Sexual