“Escola sem Partido”: é pelo
conteúdo e não pela Educação.
Bruno Saldanha - Bacharelando em Ciências Sociais pela UFRGS E bolsista em Políticas da Educação Básica pela UFRGS.
Ninguém quer ver as escolas
funcionando como diretórios partidários. Tampouco as pessoas querem escolas
hasteando bandeiras de partidos. Isso é consenso, acredito. É justamente por
esse motivo que o nome “Escola Sem Partido” é tendencioso (fácil “de pegar”) e
busca, com isso, ludibriar e ganhar o apoio da população. Acontece que o PL 867
de 2015 proíbe práticas de doutrinação política e ideológica em salas de aula,
sem esclarecer o que seriam tais práticas. No entanto, é possível perceber o
que realmente este projeto de lei pretende, ao fazermos uma breve análise sobre
quem são os seus grandes apoiadores: pessoas ligadas ao PSDB, PP, PMDB, DEM e
toda essa turma que bem conhecemos.
O tal “Escola Sem Partido”, que
prefiro chamar de “Lei da Mordaça nas Escolas”, prevê que a educação nacional
terá como princípio, além de outros, o “direito dos pais a que seus filhos
recebam a educação moral que esteja de acordo com as suas próprias
convicções”. Isso viola o princípio
posto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de que o ensino
será ministrado com base no pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas e
no respeito à liberdade e apreço à tolerância. Na justificativa do PL, fica
muito claro o teor conservador – religioso – quando afirma que os livros
didáticos e os professores praticam doutrinação, especialmente moral sexual. E
logo afirma que a moral é, em regra, inseparável da religião. Mas aí
encontramos a primeira contradição: se a convicção da família está de acordo
com todas as formas de amor, inclusive esta família possa ter um jovem filho
homossexual que freqüente uma escola, a educação escolar deve ser ministrada em
consonância com a concepção desta família? Me parece que não é isso que o
projeto estabelece. Ao contrário...
Afirmam que o ambiente de
doutrinação gera bullying político e ideológico, resultando em agressão física
aos alunos que assumem uma postura diferente daquela dominante. Ao mesmo tempo,
os defensores da Lei da Mordaça não querem escolas abordando as questões de
gênero. Esquecem (na verdade ignoram) que a maior parte do bullying e das
agressões físicas aos alunos são sofridas justamente por questões de
desrespeito à liberdade, às identidades de gênero, enfim, à diversidade.
Ao tratar de questões políticas,
sócio-culturais e econômicas, os professores devem apresentar as principais
versões e perspectivas a respeito. As principais versões são aquelas já
manjadas: o Brasil foi descoberto; o patrão ajuda o empregado ao lhe garantir
um emprego; família é um homem, uma mulher e os filhos (comendo pão quentinho
com margarina); o capitalismo oferece “grandes possibilidades”; o comunismo
representa um grande risco; e por aí vai. E se o professor disser o contrário
disso (podendo contrariar a moral da família)? É doutrinação política e
ideológica? Punição nele! Inclusive, no site do projeto “Escola Sem Partido”
está disponível um link com o nome “Flagrando o Doutrinador” para que a
população possa denunciar estes professores! E para ajudar a população, está
disponível uma cartilha com todas as dicas e um texto base para que seja
escrita a denúncia. Não bastasse isso, deverão ser afixados cartazes nos
espaços escolares, onde possam ser lidos pelos estudantes e professores.
Fica evidente que o principal
objetivo deste projeto é acabar com a gestão democrática, com a liberdade, com
a autonomia e com o pensamento crítico nas escolas, princípios fundamentais
para a redução das desigualdades e para a democracia. Na verdade busca manter a
escola como um espaço de reprodução dos princípios e valores dominantes, uma
escola que não respeita e, menos ainda, empodera os estudantes. Em resumo, é um
projeto que não se interessa pela péssima remuneração dos professores, pelas
precárias condições estruturais das escolas, tampouco importa perceber que a Escola
é do século XIX, os professores do século XX e os alunos do século XXI. O que
está em jogo não é a Educação, mas o conteúdo que as escolas podem abordar.
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