sexta-feira, 25 de agosto de 2017

O Ódio Comum...

Rafael Borba é licenciado em História pela Fapa, professor da Rede Pública Estadual.








O Ódio Comum...

Não é simples analisar um período histórico, mais difícil ainda é compreender o tempo histórico no qual estamos inseridos. Se despir da subjetividade e ser prático é um exercício complicado.

A atual conjuntura política de nossa sociedade é pautada pela polarização, opiniões e análises são rapidamente caracterizadas como sendo de “esquerda” ou de “direita” e o seu conteúdo será desprezado caso o ouvinte ou leitor se enquadre em uma posição diferente daquela que acredita ser a opinião do que esta analisando.

Este comportamento binário não ajuda no debate, é como se você estivesse constantemente pisando em ovos com medo de ser tachado de coxinha ou petralha (Aparentemente o corretor do Office é petralha, pois não me permitiu escrever este termo sem reclamar).

Outra problemática é a ânsia de opinar, todos querem tecer suas opiniões, comentar, argumentar, contra-argumentar. No entanto muitos comentam sem ter conhecimento o suficiente sobre aquilo que está sendo discutida, a política é um bom exemplo. Liberdade de expressão é, em minha opinião, diferente de afirmar que 1+1 = 3, é claro que você tem todo o direito de dizer isso, mas está necessariamente errado. No caso da política não é tão simples assim, os cálculos são muito mais complexos. É exatamente por causa desta complexidade que nos acostumamos com certas afirmações.

Infelizmente este cenário é propício para a proliferação de muitos argumentos ideológicos de ódio. Eles começam como desculpas, por exemplo: “Você entende que o colega tem uma opinião um pouco racista.”, mas perdoa porque no geral “ele é uma pessoa boa” ou porque, afinal, “ele não entende do que está falando”. Você convive com essas coisas, vai observando a realidade se transformar.

A solução para esta dicotomia não é simples, ela passa por tolerância e uma boa educação, uma mais libertária e humanista. Não é uma questão de dizer que não existe certo ou errado, é saber aceitar aquilo que é diferente, é compreender o direito do outro. Não é fácil, mas é fácil saber se você está errado:

É sempre aquele “Mas”:
Eu não sou racista, Mas...
Eu concordo com o feminismo, Mas...
Eu não tenho nada contra gays, Mas...
Hitler foi um tirano, mas...

E então ele esta ali na sua frente, um rinoceronte, como na peça Le Rhinocéros de Eugène Ionesco. Foi na época da minha graduação que um Artista, amigo meu, contou-me sobre o espetáculo, lembro que fiquei encantado com a ideia central do texto, rinocerontes andando para lá e para cá, primeiro eles causam espanto, mas com o tempo vamos acostumando com eles, algumas vezes até nos tornamos um.

Nós vamos acostumando com os discursos, com os “Sieg Heil”. Com certeza eles são rinocerontes andando na luz do dia, mas são cada vez mais comuns no cotidiano. Tão comuns que quando um aluno agride uma colega de profissão, eles se sentem comuns o suficiente para dizer que “ela mereceu!” Afinal ela não tem o mesmo discurso que eu. Não merece ser ouvida. Ela merece ser calada! Ela fica a mercê dos Rinocerontes, cada vez mais comuns.

E de onde eles vêm? Provavelmente do seu círculo de amizades, da empresa, de sua família, ele pode dormir do seu lado durante a noite e ele pode ser você! Mas eu tenho certeza de que ainda não são a maioria.

 Até onde consigo perceber, muitos não possuem a verdadeira dimensão de sua “opinião política”, mas aceitar neonazismo é um pouco demais para mim. Falta compreensão da democracia, da economia, da política. Eu pessoalmente engatinho nestes conceitos, estou longe de ser um Leandro Karnal ou um Ricardo Fitz, mas tenho certeza de que se a conclusão final são medidas mágicas como “matem todos” alguma coisa tem que estar errada, ou com o discurso ou com o individuo.

O direito político da nobreza feudal advinha de seu nascimento, era a legitimação final para o seu poder. “Sou porque assim nasci!”, para o nobre medieval a sua posição era um direito, um mérito.

O liberalismo surgiu como vertente antagônica a este pensamento, ele era a crítica ao antigo regime. Talvez eu seja um liberal ao criticar a classe Jurídica atual, descendentes da anterior? É claro que se pode afirmar que, para alçar ao cargo de juiz, você precisa ser merecedor, ter estudo, passar no concurso. Isso é verdade, mas ao filho do trabalhador, na escola pública atual, este direito lhe é negado.

Escola pública é o remédio para a “Rinocerontite”. Você não pode falar em igualdade e em sociedade capitalista enquanto não existir uma escola pública de qualidade e a resolução para isso não é assim tão complicada, ela se chama investimento.

Este investimento tem que vir de dois lugares, primeiro o financeiro. Você simplesmente não pode esperar que sem dinheiro existam condições físicas e de RH. O outro investimento tem que vir da sociedade, através do respaldo ao profissional, o professor é peça chave, nós merecemos ser respeitados.

Recentemente eu me dei conta de outro ganho que tenho na minha profissão, que vai além do monetário, é o reconhecimento que vem dos alunos quando eles te dizem que teu trabalho fez alguma diferença em suas vidas. Todo o professor faz isso, mas aqui estamos nós apanhando na cara e tendo que conviver com os rinocerontes. A única solução para isso é a escola pública de qualidade.

Com relação à polarização política, é muito mais complicado.

Talvez para alguns, este seja o texto de um petralha, para outros o texto de um coxinha...
Na verdade é o texto de um professor tentando compreender a atual polarização do pensamento político e pedindo maior investimento em educação.

Talvez a sua solução seja outra, a luta de classes, o desenvolvimento econômico, qualquer que seja ela eu tenho certeza que é inatingível sem educação de qualidade para o cidadão.
Isso se o seu objetivo for uma sociedade igualitária. Igualdade só é possível quando os índividos possuem as mesmas condições, o que está muito distante da realidade, a meritocracia não funciona se você sobe na vida por indicação, vindo de uma família rica.

A solução para a polarização política? Essa a mais difícil, ela passa por muito conhecimento. Visões políticas antagônicas sempre vão existir, mas o debate não pode ser rebaixado a uma briga de torcidas, é necessário encontrar soluções e objetivos em comum, exceto com os rinocerontes, em minha opinião.

Você precisa saber se o discurso político que defende é realmente aquilo que você espera ou acredita. É preciso aceitar a possibilidade de que você esteja errado, de que talvez você não tenha lido o suficiente, de que talvez você não saiba do que esta falando. Isso não quer dizer que você deva se calar, apenas que não é necessário defender com unhas e dentes o seu argumento e se recusar a ouvir aqueles que discordam.

É preponderante saber ouvir!

Os rinocerontes? Eu acredito que eles ainda não aprenderam a ouvir.

 Se eu acho que devemos ouvir os Rinocerontes? Não, nem toda a ideologia é valida. Devemos parar de dar espaço para o ódio, o racismo, o preconceito, o machismo, a tortura e a ignorância. 

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