Letícia Roxo é Licenciada em História pela FAPA, professora da Rede Pública Estadual
A escola e suas desigualdades
Desde muito
tempo a desigualdade se perpetua na nossa sociedade. Do Brasil colonialista até
o Brasil contemporâneo neoliberal são evidentes as marcas desse fenômeno
desigual, injusto e cruel. A pobreza da sociedade é fruto e consequência do
mundo desigual em que vivemos, gerando um ciclo vicioso. O pobre é
marginalizado por ser economicamente, culturalmente, politicamente pobre. E a
educação que, na teoria, seria para amenizar esses efeitos e mudar essa
condição vem ao longo dos anos acentuando-os, pois penaliza mais uma vez o
pobre no momento que não proporciona as mesmas condições de ensino aprendizagem
que para os homens brancos e ricos.
A escola na
teoria diz que tem como princípio a cidadania, que trabalha temas transversais,
que aborda as minorias e luta pelo fim do preconceito, da violência,
discriminação, etc. No entanto nada mais faz do que reproduzir um discurso
dominante que legitima e naturaliza a pobreza e a desigualdades sociais. Naturalizar é legitimar o fato da maioria das
pessoas serem desprovidas de terras, trabalho, moradia, comida, renda, escola.
É concordar e propagar os interesses da classe dominante. Infelizmente, os negros
são os mais afetados e discriminados pela pobreza nesse país. Obviamente são
históricas as causas: escravidão e racismo. Mas no chão da escola vemos
nitidamente essa diferenciação, através de falas de direção e professores, de
atitudes dos próprios alunos e do sentimento de inferioridade dos alunos negros
em relação a não se sentirem parte daquela escola.
A escola nada
mais é do que extensão da sociedade e nossa sociedade é “copista”, copia e cola
aquilo que lhe é transmitido, seja pela mídia, seja em sala de aula. E o que se
propaga é um discurso excludente e dominante. Onde pobreza, a desigualdade
econômica, social são culpas do pobre que não corre atrás do melhor para sua
vida, que é preguiçoso, ou seja, um discurso meritocrata que atende as
necessidades da elite. Mas que o próprio pobre propaga e acredita que seja
verdade. Que através do seu esforço pessoal ele vai conseguir mudar a sua
condição social e econômica. Não pensem
que dentro da escola esse discurso muda. Ele acontece, por exemplo, no momento
que professores atribuem a indisciplina do aluno apenas à falta de respeito.
Não levam em consideração se aquele aluno tem casa pra morar, comida pra comer,
família para lhe dar toda a base necessária para a vida em sociedade, se o
aluno vive em condições de vulnerabilidade social e afetiva, se usa drogas, se
possui material escolar, como se sente ao ver o colega com o celular moderno e
o tênis caro, enfim não discutem as condições que a desigualdade gera naquele
ambiente. Mas prolifera um discurso meritocrata de esforço pessoal para a
resolução do problema.
Infelizmente, a
escola não atende ao seu papel de formar cidadãos críticos e autônomos para
viver em sociedade. Ela está preocupada apenas, na maioria dos casos, em formar
mão de obra para o mercado de trabalho, alunos capazes de passar no ENEM, assim
sendo, são bem vistas aos olhos dessa própria sociedade. Estamos muito longe de
ter uma escola inclusiva, atenta as questões sociais, atuantes no meio, com
reais intenções de construir o conhecimento do aluno para sua real condição
social, para compreensão do seu papel e da sua posição, de esclarecer as causas
dessas desigualdades e sendo assim, este aluno não consegue compreender,
analisar, tomar consciência dessa realidade cruel em que vivemos e,
principalmente, mudá-la. Ele apenas reproduz discursos ora, midiáticos, ora políticos,
ora escolares.
Enquanto, professora estadual trabalho em uma
escola de periferia onde se percebe essas desigualdades diariamente no
cotidiano escolar. A realidade é perversa. Podemos evidenciar a presença das
mais variadas realidades sociais e econômicas na escola. No entanto, a maioria são
alunos carentes financeiramente e podemos observar que alguns buscam na escola
uma alimentação diária. Além da carência econômica são carentes emocionalmente,
se mostrando revoltados, agressivos, mas extremamente receptivos a afetividade.
Muitos dos
meus alunos nunca visitaram um museu, nunca entraram num teatro ou cinema, não
conhecem o mar, mal andaram pelos pontos turísticos da própria cidade em que
moram. Culturalmente são pobres. E quando é possível promover uma saída de
campo eles preferem o shopping, ou seja, não enxergam a importância de conhecer
e ocupar estes espaços culturais. Mas é a questão econômica a mais visível,
pois competem, invejam a propriedade privada do colega que se resume no celular
moderno, no tênis ou boné de marca. Estes sim demarcam o “status quo” dentro da
escola. E gera sentimentos e práticas condenadas, ampliando o caos social e a
desigualdades. Porque a escola faz a diferenciação dos “bons” e” maus” alunos
pelo comportamento que apresentam, ou seja, identifica o problema, mas não age
na causa dele.
A escola precisa se reformular
se adaptar a essa realidade. Temos ainda muitas dificuldades pedagógicas e
culturais para tanto. Temos uma escola, ainda conteudista, rígida no que se
refere a currículo, antiquada tecnologicamente e com algumas resistências a
modernização de pensamento. Mas a escola
é muito mais do que apenas um espaço de ensinar. É um espaço de
ensino-aprendizagem de todos os envolvidos, ou seja, alunos, professores,
equipe diretiva, comunidade escolar. Mas cabe ao corpo docente a metodologia de
como este ensino-aprendizagem vai acontecer. O que percebemos, ainda hoje é uma
escola baseada num currículo fechado, obsoleto, que não atende as demandas dos
alunos. E não aborda a realidade.
Métodos tradicionais de ensino, onde o professor ainda é o detentor do
conhecimento e seus recursos pedagógicos fixados no livro didático, na aula
expositiva, quadro negro e questionários. Esta realidade não cabe mais a escola
dos tempos modernos. Pois o aluno não se
identifica, não se vê representado naquele espaço.
Feita
esta desconstrução outras mudanças passam a ocorrer. Logo vem a construção de
um novo modelo de educação, metodologia, e professor, logo do aluno. O olhar em
relação à educação passa a ser mais global, inclusivo e
libertador. A metodologia que deveria ser adotada busca favorecer a realização
de atividades que propõem desenvolver a autoria, a criação, protagonismo e a
autonomia do aluno. Onde ele possa se ver, se sentir parte, representado e
tomar consciência do seu papel em qualquer espaço.
E ainda tem gente que acha que o porte de arma vai diminuir a criminalidade, quando tudo começa pela falta de acesso a uma educação de qualidade
ResponderExcluirExatamente Lucas. E eu realmente ainda acredito que a educação seja a salvação. Precisamos é mudar o sistema (coisa simples de se fazer, não? kkkkkkkk)
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