Jefferson Meister Pires é Bacharel em Ciências Sociais pela UFRGS, funcionário público e pesquisador.
O pensamento binário domina como nunca a cena política brasileira, com demonstrações bizarras onde os movimentos dominantes tanto na situação (extrema direita, olavistas, etc.) quanto na oposição (esquerdas e alguns poucos gatos pingados no centro e direita) se alimentam do binarismo como forma de se perpetuar cada vez mais na disputa política em campos que seriam antagônicos, mas, quando observados mais atenciosamente em seus discursos e práticas, acabam por se mostrar muito mais próximos do que gostamos de admitir.
Estamos falando claramente de grupos políticos que desejam ser “as elites” dentro da disputa político/cultural, porém, não se tratam necessariamente de elites econômicas e culturais, sendo muito mais coerente falar em grupos políticos fechados, quase impenetráveis e de pouco diálogo. Se comportam como figuras dominantes em um grande jogo, os donos da bola e do campinho ou os contestadores da rua de cima, se fecham em patotas que giram em uma dança interminável em torno do poder e de tudo aquilo que o poder oferece: cargos, dinheiro, prestígio, história, etc.
Em recentes conversas com amigos seguidores de Bolsonaro, tentaram me convencer daquilo que já foram convencidos, que a jogadora de vôlei de praia Carol Solberg se manifestou em evento esportivo contra o presidente por ser canalha e burra (segundo os diversos posts os quais fizeram questão de me apresentar como provas) por ser canalha e burra é de esquerda (lógico, esquerdistas são ou canalhas ou burros ou ambos), por ser de esquerda é comunista, por ser comunista é petista. Assim como, mais recentemente, julgam todos aqueles que se posicionaram a favor de Joe Biden na corrida presidencial norte-americana.
Em recente conversa com amigos que militam no PT, expus meus motivos para não defender as candidaturas as quais esse partido estiver ligado, mais do que isto, expus a eles os motivos para desejar que seja obliterado nesta e em todas as próximas eleições, motivos os quais venho observando em mais de vinte anos como funcionário público e militante de esquerda (não sei se sou só burro ou só canalha, provavelmente ambos). As respostas de meus amigos petistas são praticamente todas no mesmo sentido: “Se você quer virar à direita faça isso logo e não fique arranjando desculpas nos outros”; Ou seja, para vários amigos e colegas que militam no ParTidão, se você não seguir um modelo de ser esquerda (de preferência não questionando os erros do PT) você é pelego, sendo pelego você é gado, sendo gado você é de direita (e logicamente sendo de direita ou você é fascista ou não se importa que outros exerçam o fascismo).
Este problema matemático nos coloca em tristes posições onde a própria discussão política desaparece, ela estará sempre ligada a aspectos pessoais e individualistas, desejos e interesses particulares os quais são desligados de qualquer noção de bem comum. A posição política se tornou mais importante do que a própria política, engessada e imutável até que em algum momento sejamos traídos por aqueles para os quais demos nosso sangue e suor, somente neste momento é que somos capazes de questionar aquilo que até então era inquestionável.
Como aquela moça que disse ter sentido ciúmes do marido após ter se satisfeito nos atos sexuais em um swing em que participava, ao ver que o marido continuou se divertindo com o casal convidado, os agentes políticos binários estão preocupados exclusivamente com suas satisfações pessoais, se tornam cegos e incapazes de entender que a pluralidade de posições, pensamentos e principalmente satisfações é o que tornam possíveis a presença do humanismo e do amor nas diferentes questões da vida contemporânea, especialmente nas instituições de Estado, criadas com o intuito de servir a todos os cidadãos, independente de posições individuais.
A cena política nacional, no momento em que escrevo este pequeno texto, é mais parecida com uma enorme suruba alimentada por cargos e privilégios, onde os poucos convidados fazem tudo que estiver ao seu alcance para que seja um clube fechado e sem rotatividade, só participam da festa aqueles que beijaram a “mão” do porteiro. E do lado de fora do surubão tem uma galera que se une para falar mal de toda essa esbórnia, mas que até ontem eram os donos da festa e não vêem a hora de voltar para o lado de dentro do clube dos prazeres.
Confesso, ainda atordoado, que está se tornando cada vez mais difícil reconhecer as diferenças entre estes grupos do que suas semelhanças. Para encerrar deixo uma reflexão lida no Blog Universa do portal UOL de onde destaco um pequeno trecho deste fabuloso texto escrito pela Psicóloga, Terapeuta Sexual e blogueira, Ana Canosa:
“No final das contas, não ser uma unanimidade é, de fato, o grande desafio do ser humano. E há quem aposte que, na cultura pós-moderna, marcada pelo capitalismo de consumo, nos voltamos cada vez mais para uma necessidade infantil de satisfação plena. Se não reconhecermos essa nossa porção cada vez mais narcisista, estaremos fadados a cavar cada vez mais fundo o buraco do vazio existencial, em vez de fazermos as pazes e conviver com ele.”
Nossa política partidária abraça os sentimentos individualistas e narcisistas, mais ainda, se alimenta desses sentimentos para criar as brechas necessárias onde os ideais desaparecem e são substituídos pelas necessidades, necessidades de quem?
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