domingo, 1 de outubro de 2017

O moralismo na agenda pública e a necessidade de um discurso de esperança


Paulinho dos Santos é Acadêmico de Ciências Sociais pela UFRGS e Militante de causas sociais


O moralismo na agenda pública e a necessidade de um discurso de esperança



A insatisfação do eleitor com a política e com os políticos tem aumentado a cada dia. Constantes investigações encampadas pelo Ministério Público têm desnudado certos crimes de alguns (não poucos) políticos que se utilizaram e, ainda, se utilizam da vida pública para autopromoção e enriquecimento ilícito.
Agregado a isso, a forte cobertura da imprensa, sobretudo em difundir vazamentos seletivos dessas investigações, tem feito com que o eleitor receba uma carga de constantes notícias negativas da classe política, incorporando, então, um discurso que considera a política como a geradora dos grandes males em uma sociedade que atravessa determinado período de crise.
De acordo com o site “Manchetômetro”1, entre os meses de janeiro e setembro de 2017, os jornais Estadão, Folha de São Paulo, Jornal Nacional e O Globo, apresentaram cerca de 7 mil matérias jornalísticas “contrárias” à política. No entanto, somente 800 matérias “favoráveis” foram veiculadas por esses mesmos jornais. Nesses cálculos, não estamos nos referindo nem às matérias que apresentam certa “ambivalência”, nem àquelas consideradas “neutras” pelos pesquisadores.
Quando nos atemos aos “partidos políticos”, somente no mês de maio de 2017, os já referidos jornais apresentaram pouco mais de 200 matérias contrárias ao PT (mês em que o PT teve mais notícias negativas). Já as notícias favoráveis, somando os nove meses em questão, não chega a um número de 30 notícias.
Quando o partido político pesquisado é o PSDB, o mês de junho é o de maior número de notícias negativas, em que o partido quase alcança 80 notícias contrárias veiculadas na imprensa. No mesmo mês, o PSDB quase alcançou 20 notícias favoráveis, praticamente superando PT em notícias positivas somente em um único mês. Além disso, paradoxalmente, junho também foi o mês em que o partido teve o maior número de notícias positivas veiculadas.
Ao compararmos as notícias sobre Lula e Aécio Neves, o petista superou a marca de 225 notícias negativas somente no mês de maio, enquanto Aécio, no mês de junho, mês em que teve o maior número de notícias contrárias a si, alcançou cerca de 70 notícias. Quanto as positivas, Aécio Neves superou Lula em todos os meses.
Como é possível verificar, notícias negativas relacionadas à política e aos políticos são amplamente difundidas para o eleitor. No entanto, nem todos os partidos e nem todos os políticos recebem o mesmo tratamento. Lula e o PT são alvos de constantes notícias contrárias que são levadas diariamente à casa do eleitorado brasileiro. O tucano Aécio Neves e o seu partido, o PSDB, estão bem menos na mídia do que os petistas. E, quando as notícias são negativas, as positivas também aparecem no sentido de minimizar os ataques.
Ou seja, por mais que Lula e o seu partido sofram diariamente com uma grande quantidade de notícias negativas, nenhum partido e nenhum político passam incólumes.
Nesse sentido, é importante trazer ao debate o que fora escrito pelo juíz federal Sergio Moro (2004, p. 57), juiz responsável pela Operação Lava Jato no âmbito da Justiça Federal de Curitiba, no texto “Considerações sobre a operação Mani Pulite”, que ocorrera na Itália:
A independência judiciária interna e externa, a progressiva deslegitimação de um sistema político corrupto e a maior legitimação da magistratura em relação aos políticos profissionais foram, portanto, as condições que tornaram possível o círculo virtuoso gerado pela operação mani pulite. (Grifo meu).
Ora, como é possível perceber, há uma estratégia traçada nas constantes investigações que estão sendo conduzidas no Brasil, que é a estratégia da deslegitimação da política e dos políticos profissionais. Para tanto, tende a ser extramente frutífero o trabalho realizado conjuntamente pelos agentes do sistema de justiça e a imprensa.
Assim como a operação Mani Pulite, na Itália, buscou a deslegitimação da classe política, no Brasil, para que quaisquer operações contra corruptos e corruptores fossem bem sucedidas, supõe-se a necessidade de incorporar tal estratégia, pois “enquanto ela (a ação judicial) contar com o apoio da opinião pública, tem condições de avançar e apresentar bons resultados” (MORO, 2004, p. 61).
Nessa lógica, todos os políticos e todos os partidos políticos passam a ser alvos da imprensa, pois a descontituição da política é a legitimação da justiça. Ou seja, desconstituir é também legitimar.
Seguindo nessa linha de desconstituição e trabalho conjunto, o Ministério Público começa a promover campanhas contra a corrupção e pela moralização do setor público, se transformando em uma espécie de “bastião da moralidade”. O Projeto Lei que cria as 10 medidas contra a corrupção é apresentado e defendido a tal ponto que a instituição cria um website para elucidar o texto e acompanhar, de forma pública, a tramitação do projeto no Congresso Nacional.
O projeto que prevê a utilização de provas em processos colhidos de forma ilegal, desde que tenha sido realizada de boa fé, e, também, limita a utilização do habeas corpus não é nenhuma unanimidade inclusive entre os agentes do sistema de justiça. Segundo alguns juristas e membros do Supremo Tribunal Federal, como o Ministro Gilmar Mendes, por exemplo, o Projeto de Lei encampado pelo Ministério Público dificulta a defesa dos investigados e restringe direitos.
Como defesa, o Ministério Público cita a necessidade de limpar a política da corrupção. Nesse sentido, o ambiente criado é de que todos aqueles que se colocam de forma contrária ao projeto parecem estar favoráveis a corrupção.
Ora, quanto mais se debate sobre corrupção, mais há necessidade de se apresentar um caminho de esperança. As investidas de alguns agentes do sistema de justiça em conjunto com a imprensa têm levado o debate, nas ruas, a centralizar naquele que eles elegeram como o grande problema: a corrupção.
Não que a corrupção não deva ser combatida. Longe disso! Só que, enquanto passamos horas e horas falando da corrupção e elegendo os políticos para atacar, políticas de redução do Estado e de precarização do serviço público vem sendo implementadas.
No governo federal, o orçamento para políticas sociais tem sido cada vez menor. A educação, a saúde e a assistência social tem tido cada vez menos investimento público.
No Rio Grande do Sul, parcelamento de salários e a extinção de fundações e autarquias estatais são a tônica do processo político.
Por isso, é preciso apresentar um novo caminho às pessoas. Um caminho de esperança!
É preciso relembrar que o Brasil já havia se livrado da fome. É preciso relembrar que é possível aumentar os salários dos servidores públicos estaduais e utilizar essa forma de governar para aquecer a economia.
E é preciso mais. É preciso construir saídas para toda essa crise com a participação das pessoas. É preciso fazer com que as pessoas voltem a acreditar na política, por mais difícil que isso pareça ser nesse momento.
A esperança é capaz de vencer o ódio!

1 “Manchetômetro” é um website sobre temas de economia e política, criado pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que tem por objetivo acompanhar a cobertura jornalística dos principais jornais do país em relação aos temas já citados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário